Oh, mercy, mercy me…

Falou-se tanto sobre Jacko que tenho ouvido muito durante estes dias os cantores da Motown.  E de todos os cantores do cast desta gravadora o que melhor simboliza o que era a Motown, em minha modesta opinião,  é um cabra chamado Marvin Gaye.  E nesta madrugada de trabalho fiquei ouvindo sem parar a obra prima “What´s Going On” de 1971.

Este disco nasceu da depressão do artista diante de um mundo tão estranho, onde a perda de referencial era como um soco no estômago.  Ele havia perdido no ano anterior sua parceira de dueto Tammi Terrell,  que havia morrido em razão de um tumor cerebral.  Da escuridão em que vivia, Marvin transformou em um album que mostra-se perfeito em tudo: voz cristalina, letras extremamente bem construídas e instrumental primoroso.

A voz de Marvin, de uma urgência impar, mostrava-se como um grito de alerta ao que o mundo estava se transformando em 1970/71:  a loucura da guerra do Vietnan, o caos urbano, violência crescente, danos ecológicos e os descaminhos que as famílias estavam tornando-se.

Uma música em especial tem um significado importante quando se sabe como foi a morte de Marvin Gaye: “God is Love”.

A canção começa com os seguintes versos:

“Oh don’t go and talk about my father
God is my friend
Jesus is my friend
He made this world for us to live in, and gave us everything
And all he asks of us is we give each other love.”


Gaye começa a letra que fala de forma apaixonada de um Deus que é Amor, falando em alto e bom som:  “Não me venha falar de meu pai…”

O pai de Marvin era um pastor extremamente fundamentalista que reprimia tudo em seu filho, de tal forma que o filho foi se alistar no exercíto só para fugir das garras de um pai louco em seu fundamentalismo e forma de ler as Escrituras Sagradas.  O pai amaldiçoava o filho por estar cantando fora da igreja e ser instrumento do diabo para os incrédulos.  Gaye viveu com a sombra amaldiçoadora de um pai durante toda a sua vida.  Tendo todas as questões que advém de uma formação religiosa/familiar completamente castradora. A culpa vivia cercando o canto do gênio.  Tornou-se viciado e alcóolatra.

Em 1983 Gaye foi assassinado pelo próprio pai.  Num episódio tão comentado que até hoje traz arrepios pela forma tola do assssinato.

Sei das escolhas que temos em nossas vidas. Sei também que a formação familiar pode trazer enormes malefícios a um indivíduo. Não posso negar que a criação religiosa extremamente repressora pode formar verdadeiras aberrações.

Sei de tudo isto…

Só que a letra de “God is love” fala algo que mexe muito comigo:  ela fala da Graça de Deus de forma impactante. Muitos não estão nem ai para isso ou não professam a fé em Cristo. Só que eu acredito que pela Graça e Sacrifício de Cristo posso dizer que “Deus é meu amigo / Jesus é meu amigo”. Posso cantar que para estes, e mesmo para os que não abraçam esta realidade, que “ele fez este mundo para vivermos e nos deu tudo! E tudo que ele pede à nós é que nos amemos” Esta verdade ultrapassa até mesmo a criação bastarda de um pai louco. Esta afirmação ultrapassa qualquer barreira emocional que me foi dada nesta caminhada.

Gaye canta num refrão o desafio da Graça e Perdão bem próximo da proposta de Cristo no Sermão do Monte:

“Ame sua mãe, ela vela por você
Ame seu pai, ele trabalha por você
Ame sua irmã, ela é boa para você
Ame seu irmão, ame seu irmão”


Não posso dizer onde Gaye está, mas sei o que ele propôs em sua canção e isto é de inegável valor… A Graça Comum é algo que infelizmente a igreja tem esquecido e até mesmo amaldiçoado. Deus usa para falar quem Ele quer e com certeza absoluta usou Marvin Gaye!